segunda-feira, janeiro 08, 2007

Superman Returns

Eu confio na Electronic Arts.

(Calma lá. Não comece a questionar essa minha afirmação ainda. Continue lendo o texto, deixe para retorquir depois.)

Boa parte dos jogos da EA que conheço são dignos de menção honrosa na minha galeria dos "Meritórios", quando não na dos indispensáveis. The Sims 1 e 2, os atuais lançamentos da série Need For Speed (underground 2 em especial), Battlefield, Splinter Cell, Half Life 2, Medal of Honor, Command and Conquer, etc, etc, etc. Isso pra não mencionar Sim City, que vem sendo minha menina dos olhos dos games de computador desde meu primeiro contato com um Pentium 166. Põe uma década nisso aí, pelo menos.

Confio na EA Games desde então. Não tinha quaisquer desapontamentos com os lançamentos da empresa até comprar, semana passada, um dos mais recentes jogos produzidos por eles - que esperei ansiosamente, diga-se de passagem, mais até do que o filme: Superman Returns.


Deixe-me ressaltar um ponto que julgo ser importante para tornar essa crítica o mais confiável possível: desde o momento em que tomei conhecimento do jogo (por intermédio de um trailer disponível no site do game, aquele de 20.2mb, o último da lista) minha postura com relação a ele foi de extremo otimismo. Acredito sinceramente que o Super-Homem é um dos heróis com maior potencial pra render um ótimo jogo e tinha esperanças de que a indústria dos videogames FINALMENTE havia percebido o fato. Esperava que pelo menos os caras da EA Games, sempre tão inovadores e criativos - ao contrário do povo da Sierra, cuja especialidade parece ser copiar o trabalho alheio - fossem se dar conta das infindáveis e divertidíssimas possibilidades que o azulão carrega consigo e que, com a tecnologia atual, poderiam ser satisfatoriamente encarnadas em um jogo.

Consigo ouvir Lex Luthor, na voz de Kevin Spacey, rindo da minha inocência e dizendo "Seu tolo crédulo e ingênuo!". E tem razão, o maldito careca.

Começarei a análise tratando dos dois aspectos favoráveis do jogo. Fiz uma lista aqui na minha caderneta, enquanto jogava e me contorcia de ódio, e admito que não foi fácil pensar em prós, considerando que só os contras me saltavam aos olhos.

A sacada genial do jogo - alguma haveria de ter - é a barra de energia de Metrópolis. Convenhamos: o escoteiro é um dos super-heróis mais apelões de que se tem notícia. Estabelecer um limiar de dano para ele é como fazer um jogo sobre deus e limitar seus poderes. Existem outras maneiras de explorar as fraquezas do personagem e os desenvolvedores da EA games souberam fazer isso muito bem. Você pode tomar quanta porrada quiser, mas é bom ficar de olho nos danos que a cidade está sofrendo, é isso que determina seu sucesso ou fracasso.

Todos os poderes do kriptoniano estão lá: supervelocidade, supersopro, visão de calor, sopro congelante, vôo super-rápido, super-força e por aí vai. Não que a super-força seja lá de grande valia, mas explicarei as razões dessa afirmação mais à frente.

Os gráficos são - como era de se esperar - lindos. Sério, sem eufemismos aqui. São lindos, Metrópolis é absurdamente real com suas ruas, avenidas, arranha-céus, praias, colinas, praças, veículos e cidadãos. O céu é um espetáculo à parte e voar entre os prédios durante o pôr-do-sol é realizador para os pobres mortais que - como eu - sempre acharam que voar ignorando completamente as leis da gravidade era o superpoder mais legal que alguém poderia ter.

O jogo é lindo, enfim. Se o que você quer é exibir beleza, se você quer um game pra andar de mão dada no shopping e God of War e Shadow of The Colossus não estiverem disponíveis, leve Superman Returns e ele não vai te decepcionar.

Quando mencionei que meu sonho é experimentar a sensação de voar à vontade, sem empecilhos, não estava brincando e era o mínimo que esperava. Até nisso, entretanto, ele me decepcionou. Em primeiro lugar porque a jogabilidade não está um lixo, mas é bem ruim. Vai levar um bom tempo até que você consiga voar de forma competente por dentro da cidade. Se é que vai conseguir, com todos os incidentes se sucedendo interminavelmente. Exatamente: você é escravo do jogo. As missões vão surgindo uma depois da outra, sem te dar tempo para respirar, apagar veículos incendiados ou socorrer cidadãos feridos.

Esse é, aliás, um dos pontos que mais me irritou: não sei quanto a vocês, mas o bom-senso me diz que se alguém for fazer um jogo tridimensional com uma enorme cidade à disposição para ser explorada, nada mais justo do que dar ao jogador TEMPO para explorá-la, enchê-la de side quests e deixar os gatilhos à disposição do personagem. Ele decide se quer acioná-los ou não. De que vale criar becos, vielas, avenidas, ruas, cruzamentos e edifícios e impedir o personagem de esmiuçá-los? Mais importante ainda, pra quê fazer tudo isso se a interatividade com o cenário for, na melhor das hipóteses, NULA?

Não existe nada a se fazer no jogo além de seguir a história. Aliás, minto: existe, sim. Você pode sair caçando os 100 gatos escondidos pelo mapa. E só. Também pode pegar pedestres, postes, carros, o globo no topo do Planeta Diário e garotos-propaganda gigantes no topo de lanchonetes. Por isso sua super-força é inútil. Nada disso tem qualquer relevância para o jogo, porém. Serve só pra te distrair do fato de que não há nada pra ser feito no jogo além de descer a porrada em vilões.

Ah, é. Os vilões. O primeiro que você enfrenta, por um período que parece interminável, é o Metallo. Quando ele não está presente e a batalha é apenas contra os capangas é preciso uma boa dose de paciência. Todas as missões parecem ser a mesma. A variedade de adversários é ínfima. Quando Metallo finalmente aparece, vira-e-mexe exala uma aura de kriptonita que o torna invencível. Nesses momentos é impossível atingí-lo de qualquer forma: visão de calor, supersopro, carros arremessados... É preciso esperar que o jogo desligue esse recurso altamente apelativo para poder retomar a batalha contra o vilão. Enquanto isso você tem que voar pela cidade, deixando a segurança de Metrópolis ao deus-dará. E a barra de energia da cidade não dura muita coisa.

Ainda não cheguei a zerar Superman Returns simplesmente porque jogá-lo me força a fazer uso de toda a minha (baixa) reserva de paciência. Me contorço de raiva ao ver que todo o potencial do personagem, somado ao dos desenvolvedores da EA, rendeu apenas isso: um game tão bonito quanto tedioso, cuja única possibilidade é cumprir missões repetitivas contra inimigos repetitivos.

Apesar de tudo, ainda confio na Electronic Arts.
Mas com ressalvas.

Se você viu o filme - outra porcaria, aliás -, deve se lembrar de Jor-El dizendo "Eles podem ser um grande povo, Kal-El. Eles querem ser". Com esse jogo é mais ou menos a mesma coisa. Eles poderiam ter feito um grande game. Queriam fazer.

Infelizmente, para os fãs, faltou capacidade pra tanto.

(Texto postado originalmente no meu outro blog)

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